«Nunca compreendi o que é que se passou no Terreiro
do Paço. Porquê tanto ódio, tanto sangue? Porque é que fizeram aquilo?
Eu que não pensava a não ser no bem do meu povo?...(...) Foi necessário
eu sofrer tanto para que vocês me amem tanto, mulheres do povo. Vós,
mulheres, viúvas como eu, que eram jovens quando eu também era jovem,
ofereceram-me flores e lágrimas… Quem sabe se quando fizer a minha
última viagem a Portugal elas me irão oferecer flores de novo?».
Amada por uns, odiada por outros, D. Amélia de
Orleães, a última rainha de Portugal, viveu num mundo em grandes
transformações políticas, sociais e culturais. Princesa de França, mas
portuguesa de coração, assistiu ao assassinato do marido e do filho,
príncipe herdeiro, a tiro de carabina em pleno Terreiro do Paço e ao fim
da monarquia num país que a havia acolhido com entusiasmo. Rumou ao
exílio primeiro em Inglaterra depois em França, viveu a Primeira Guerra
Mundial, resistiu contra a ocupação nazi, recusando deixar o país que a
acolhera e que também era seu. Contudo, apesar da tragédia que marcou o
seu quotidiano, D. Amélia orientou a sua vida pela divisa que escolheu
para si: Esperança. José Alberto Ribeiro, diretor da Casa-Museu Dr.
Anastácio Gonçalves, um apaixonado pela figura desta rainha alta e de
personalidade forte, traz-nos uma biografia reveladora de factos e
acontecimentos até agora ignorados ou silenciados sobre a sua vida. Após
anos de pesquisa em arquivos nacionais e estrangeiros, nomeadamente no
Arquivo Nacional de França, em Paris, da leitura dos diários privados da
rainha, escritos ao longo de 65 anos, desde que chegou a Portugal até
ao fim dos seus dias, o autor reconstituiu a vida e o quotidiano de D.
Amélia. Da sua infância, passando pelo seu casamento, a relação com D.
Carlos e com os filhos de quem sempre foi uma mãe extremosa, os dias
comuns e os dias de grande gala, os seus gostos, a sua curiosidade pelas
novidades da ciência, pela cultura e as suas ações de solidariedade,
passando pelos seus desencantos e tristezas, o exílio forçado, o
calvário da morte de mais um filho, D. Manuel, as questões de sucessão
do trono português, e a sua relação de correspondência com António de
Oliveira Salazar que a convida a visitar Portugal. A rainha deixou
expresso que após a sua morte estes diários deveriam ser queimados, o
que não veio acontecer. José Alberto Ribeiro foi o único historiador a
ter acesso, na sua totalidade, a estes diários, bem como a um conjunto
de imagens desconhecidas que são reproduzidas nesta biografia amplamente
ilustrada. D. Amélia morre a 25 de outubro de 1951, na sua cama gravada
com as armas de França e dos Bragança. Tinha então 86 anos. As suas
últimas palavras foram: «Levem-me para Portugal, adormeço em França mas é
em Portugal que quero dormir para sempre. No presente, Deus está
comigo.»
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